Península ibérica: investimento institucional no setor agrícola ultrapassou os 4.100 milhões de euros, nos últimos três anos
Apesar do contexto geopolítico incerto e do impacto das
taxas aduaneiras no comércio global, as perspetivas para o setor agroalimentar
na Península Ibérica são positivas. Há interesse por parte dos investidores e o
bom arranque de 2025 aponta para uma retoma do mercado este ano, com o
previsível fecho de transações que foram adiadas ou suspensas em 2024.
O relatório “Agribusiness Iberian Report” da CBRE revela um
volume de investimento institucional, até maio de 2025, superior a 400 milhões
de euros — metade de todo o montante transacionado em 2024, no mercado ibérico.
Uma das grandes operações que marcou o arranque de 2025 foi
a venda dos ativos do Grupo Agrihold, participado pelas famílias Martinavarro e
Ballester, fundadoras da Citri&CO, numa transação de 700 hectares no
Alentejo (Herdade da Zambujeira), assessorada pela CBRE.
Apesar do abrandamento do investimento em 2023, causado pelo
desalinhamento nos preços e pelas complexidades regulatórias, o volume total de
investimento institucional na Península Ibérica, entre 2022 e 2024, ultrapassou
os 4.100 milhões de euros. Estes números evidenciam o forte atrativo do setor,
que se distingue por ser menos volátil do que outros ativos. “Nos últimos anos,
o investimento institucional tem sido impulsionado pela perspetiva de
rentabilidades sólidas a longo prazo e pela oportunidade de construir
portfólios diversificados. A previsão de concretização das operações adiadas no
ano passado, aliada ao ajustamento das expectativas de preço entre compradores
e vendedores, e a um setor cada vez mais especializado e profissionalizado,
continuará a dinamizar o mercado, que conta cada vez com mais intervenientes
envolvidos”, explica Manuel Albuquerque, responsável pelo departamento de
Agribusiness na CBRE no Sul da Europa (Espanha, Portugal e Itália).
A CBRE analisou o perfil dos investidores no setor do
agronegócio ibérico entre 2022 e 2024, mapeando mais de 500 intervenientes e o
volume transacionado nesse período.
O capital institucional já representa cerca de metade do
investimento realizado na região, englobando três perfis principais: os fundos
especializados em Agribusiness — criados especificamente para investir neste
tipo de ativo e com equipas dedicadas —, que representam 25% do capital; os
fundos generalistas, como private equity ou imobiliários com exposição a vários
setores, que somam 14%; e os family offices, responsáveis por gerir o
património de famílias ou de investidores de elevado património líquido, com
uma maior preferência por tickets pequenos e médios, que representam 10%.
Por sua vez, os produtores industriais, que representam 51%
do capital investido no setor ibérico nos últimos anos, não atuam numa lógica
de investimento financeiro, mas sim numa perspetiva operacional. São, na sua
maioria, empresas com raízes industriais — muitas vezes privadas ou de cariz
familiar — que expandem a sua atividade no agronegócio como parte do seu
crescimento estratégico, e não enquanto gestores de capital.
Neste contexto, é frequente procurarem novas localizações
para complementar a produção existente, como no caso da fruta fresca, alargando
as janelas de colheita e reforçando a sua competitividade ao longo de todo o
ano. Este dinamismo do setor reflete-se também na diversidade das operações
realizadas: mais de 40% das transações entre 2022 e 2024 foram inferiores a 10
milhões de euros, cerca de 40% situaram-se na faixa entre 10 e 50 milhões de
euros, enquanto os investimentos superiores a 50 milhões representaram
aproximadamente 20% do total.
As transações acima de 100 milhões de euros constituíram uma
parcela menor, evidenciando um mercado segmentado e com oportunidades para
vários perfis de investidores. “A Península Ibérica alcançou em 2024 o primeiro
lugar na Europa em valor de produção agrícola, o que reforça o seu
posicionamento como o mercado de investimento mais institucionalizado e
atrativo a nível geoestratégico. A crescente profissionalização do setor está a
abrir caminho a uma maior diversidade de investidores — desde produtores industriais
com operação própria, a investidores imobiliários que compram para arrendar,
até fundos financeiros como private equity ou fundos de pensões internacionais,
com tickets que podem ultrapassar os 100 milhões de euros. Estes investidores
procuram não só rentabilidade, mas também impacto positivo no capital natural”,
contextualiza Manuel Albuquerque.
Ao mesmo tempo, os desafios de sucessão geracional, a
necessidade de eficiência e as consequências da mudança climática estão a
transformar o setor, com a rotação de ativos, alteração de culturas e aumento
da dimensão das explorações. Neste contexto, “os produtores locais tornam-se
estratégicos para abastecer a Europa e explorar novos mercados emergentes.
Ainda assim, não podemos ignorar fatores de risco como a burocracia nos
processos agrícolas ou as limitações comerciais e logísticas impostas por medidas
aduaneiras, num setor profundamente globalizado”, acrescenta o responsável. Na
Península Ibérica, cerca de 20% das terras aráveis são de regadio, um valor
significativamente superior à média europeia (5%). A presença de água é um dos
critérios-chave para o investimento no agronegócio, mas outros aspetos, como o
clima, a qualidade do solo e a dimensão das propriedades em Portugal e Espanha,
fazem desta região uma oportunidade real e atrativa para o investimento neste
segmento.
As culturas com maior área plantada são cereais em grão
(cerca de 5,9 milhões de hectares) e olival (3 milhões de hectares). Entre 2013
e 2023, a área de frutos secos cresceu quase 300 mil hectares. Em 2024,
aumentou a área dedicada a azeitonas e frutos secos (pistáchios em Espanha e
amêndoas em Portugal), enquanto a área de vinha diminuiu. Em Espanha, a área de
citrinos reduziu, ao passo que o abacate ganhou importância em Portugal. Quanto
ao preço de venda dos produtos agrícolas (pago ao agricultor), registaram-se
flutuações significativas: o azeite caiu 55% nos últimos 12 meses, enquanto as
amêndoas subiram 69%. Os preços das laranjas caíram 11%, enquanto o tomate
(+25%), os morangos (+19%) e os mirtilos (+18%) registaram aumentos.
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